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ESG em banho-maria? Guerras, juros e menos investimentos nos EUA explicam atrasos, diz advogada do IBGC Letícia Málaga

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A agenda sobre ESG tem sido prejudicada por guerras, juros altos e pela redução de investimentos nos Estados Unidos. Perspectivas para 2024, no entanto, são de melhoria do cenário

Por Letícia Málaga, sócia especialista do Peck Advogados membro da comissão de inovação do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa

Definitivamente, 2023 não foi o ano do ESG. Com a conjuntura econômica global desfavorável desde a pandemia, duas guerras em curso, juros altos pelo mundo e incertezas que se arrastam há trimestres, a percepção é que as empresas estão fazendo o que dá (para sobreviver) e não necessariamente o que deve ser feito. Para piorar, os reguladores que vinham numa toada grande até o pré-pandemia, com exigências crescentes, também parecem ter colocado o pé no freio. Diante desse cenário, pensar no sustentável ficou para depois. Pelo menos para muita gente. A sustentabilidade vive um ano em banho-maria, analisa Letícia Málaga, membro da comissão de inovação do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e sócia da Peck Advogados, que recentemente celebrou 19 anos de história.

Embora a realidade de muitas empresas hoje passe longe das melhores práticas definidas pela sigla (já que não são obrigatórias), Letícia observa que há grandes companhias muito comprometidas com a causa e que continuam investindo forte no conceito – caso da Natura e da Gerdau. Essas e outras, comenta, podem ser espelho para as demais.

“Hoje essa não é a pauta número um, mas, por outro lado, tem as questões climáticas”, comenta Letícia.

Como a pauta do clima é muito forte nas agendas globais da ONU, o ESG não parou, mas é fato entre muitos CEOs e também fundos, os investimentos perderam fôlego em 2023. A começar pelo apetite dos investidores. Os aportes nessa área caíram nos últimos meses nos EUA, saindo de US$ 340 bilhões sob gestão de fundos ESG para US$ 315 bilhões no final de setembro, relata.

“A verdade é que é muito mais fácil as empresas e os investidores pensarem em sustentabilidade em tempos de bonança do que de crises. Uma das explicações para essa redução é o fato de os fundos de investimento terem a responsabilidade de fazer alocação nos produtos de “melhor retorno”. Pelo menos no curto prazo. Aí fica a questão: investir em questões sustentáveis e ter retorno menor? São questões que acabam se sobrepondo. São escolhas. O mercado ainda está criando cultura. Se você tem um cliente alemão, ele está mais ligado a isso; já um asiático menos ou zero. O brasileiro ainda está tentando se entender e sobreviver. Tem empresas com práticas bem legais, boas, mas tem outras que ainda não”, explica Letícia.

A boa notícia é que os motores devem reaquecer no próximo ano. Ou seja, 2024 tende a ser melhor para o ESG do que foi este ano.

Monitoramento de stakeholders precisa ser prioridade corporativa

O trabalho escravo ainda está longe de ser um problema do passado do Brasil. Ele ainda existe, muitas vezes distante das metrópoles.

“Fora das grandes capitais tem trabalho escravo, infantil e desafios enormes a serem vencidos. Como o Brasil é um país muito continental, realmente a gente não tem visão do que acontece fora do nosso olhar”, alerta.

Por esse motivo, é obrigação e responsabilidade das empresas que averiguem sua cadeia de fornecedores entre seus stakeholders.

“Alguns setores são mais vulneráveis que outros, há uma falta de atenção do próprio contratante”, observa a advogada.

Eis que aí as empresas precisam se perguntar: como garanto minha cadeia de fornecedores? Eu exigir na ponta um valor menor do meu fornecedor pode trazer consequências como o não pagamento de impostos ou de valores justos aos colaboradores do meu fornecedor? Como garantir os direitos humanos e questões trabalhistas? Posso baixar um pouco a minha margem de resultado para garantir que isso aconteça? Essa última questão está diretamente relacionada à remuneração dos executivos, cujo ciclo de vida dentro das empresas está cada vez mais curto. O caminho, aponta Letícia, está no coletivo, no movimento conjunto de várias empresas.

Trabalho análogo à escravidão por parte de terceiros mostra lacuna interna

Casos de companhias flagradas praticando trabalho análogo à escravidão, mesmo quando o ocorrido envolve fornecedores, devem obrigatoriamente checar e rechecar a forma como são tratados os colaboradores, mesmo que temporários, de seus parceiros.

“Se acontece é porque um trabalho interno não foi feito e isso é inadmissível”, afirma Letícia, recomendando que se faça um trabalho sério de auditoria, com direito a visitas, questionamentos e solicitação de documentos – esses, inclusive, com a verificação posterior da veracidade.

“O prestador pode dizer que os trabalhadores estão sendo pagos, que está tudo em dia e que eles dormem em um ambiente limpo e regular. Aí as pessoas dormem amontoadas no celeiro. Tem haver uma auditoria de forma completa.”

Mesmo que o fornecedor esteja na Ásia, é papel do comprador visitar in loco. Inclusive, na indústria têxtil, que tem sido globalmente cobrada. A recorrência também é essencial, a exemplo de visitas surpresa. Embora o Brasil tenha direitos trabalhistas, em muitos lugares da Ásia não há. Nesse caso, a empresa precisa se questionar sobre quem quer trazer à mesa para se relacionar.

Letícia diz que é preciso questionar as práticas que os fornecedores têm em relação aos pilares de direitos humanos e extrapolar as questões trabalhistas.

“Há, por exemplo, políticas de licença-maternidade estendida, a pessoa pode sair durante esse período, existe algum auxílio adicional? Não é só cumprir a lei. Cumprir a lei é o básico”, finaliza.

Fonte: Integridade ESG

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