O voto do ministro Dias Toffoli no Supremo Tribunal Federal (STF), pela inconstitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil da Internet, representa um momento de atenção no debate sobre a responsabilidade das plataformas digitais no Brasil. Esse dispositivo, que condiciona a responsabilização das plataformas à existência de uma ordem judicial específica para a remoção de conteúdos ilícitos, foi considerado pelo relator como insuficiente para lidar com os desafios impostos pelo ambiente digital contemporâneo.
Toffoli argumentou que a norma confere uma “blindagem jurídica” às plataformas, dificultando a proteção de direitos fundamentais como a honra, a privacidade e a dignidade humana. Ele também destacou que as transformações tecnológicas e sociais desde a promulgação do Marco Civil demandam uma revisão normativa para assegurar um equilíbrio mais eficaz entre liberdade de expressão e responsabilidade. O ministro ainda apontou que o modelo vigente transfere ao Judiciário o ônus excessivo de atuar na moderação de conteúdos, enquanto as plataformas, que lucram diretamente com o ecossistema digital, deveriam assumir maior responsabilidade.
Um dos principais aspectos abordados no voto foi o impacto dos algoritmos na amplificação de conteúdos nocivos e na criação de bolhas informacionais, que promovem desinformação e discursos polarizados. Toffoli sublinhou que a sistemática atual não responde adequadamente à rapidez com que conteúdos ilícitos se propagam, tampouco à gravidade dos danos que podem causar.
A discussão sobre o futuro da regulação no Brasil inclui agora propostas de inspiração internacional, como a criação de um órgão colegiado similar ao Digital Services Act (DSA) europeu. Essa solução, defendida por nossa CEO, Patrícia Peck Pinheiro, busca padronizar os Termos de Uso das plataformas, estabelecer protocolos de colaboração entre as partes e atuar de maneira mais ágil, reduzindo os custos sociais e econômicos da judicialização excessiva. Um órgão colegiado permitiria que questões complexas fossem encaminhadas ao Judiciário, mas resolveria de forma administrativa os casos mais simples e recorrentes.
As implicações da decisão do STF são amplamente debatidas. Empresas como Google e Meta têm apontado que a eliminação da exigência de ordem judicial não resolveria a questão dos conteúdos ilícitos e poderia aumentar a censura, afetando a liberdade de expressão. Ainda assim, especialistas e representantes de setores impactados veem na revisão da norma uma oportunidade de alinhar o Brasil às melhores práticas internacionais, como o NetzDG alemão e o próprio DSA europeu.
Embora o julgamento prossiga na próxima semana com o voto do ministro Luiz Fux, relator de outra ação sobre o tema, o debate já ressalta a necessidade de novas abordagens legislativas. A decisão final do STF terá impacto profundo no futuro da regulação digital no Brasil. Independentemente de o Artigo 19 ser declarado inconstitucional, uma coisa é certa: todos os caminhos já apontam para a necessidade de atualização do Marco Civil da Internet, que o que cabe ao Congresso Nacional realizar em um futuro próximo, garantindo, assim, que a legislação se mantenha em compasso com a transformação tecnológica da sociedade.